Capítulo de algo maior, ou menor. Sei lá.
***
A luz do sol apareceu vermelha, rasgando o céu, lá por trás
da península de Maraú. A ilha da Gerumana era uma sombra se elevando sobre o
mar do canal. O ar ainda frio. Logo o sol desceria queimando tudo.
Teófilo ouviu um estrondo, vindo lá das bandas da Ponta de
Caieira. Imaginou que fosse Raimundo Reis matando os peixes.
“Um desperdício. Uma maldade com a natureza. O desgraçado
ainda vai se dar mal. O certo é pescar de linha, de rede de arrasto; o certo é
usar a malha certa na rede, para não pegar os peixes pequeninos, que não servem
para comer. É certo usar bomba? Milhares de ovas perdidas. O homem é burro.
Raimundo Reis também é meu amigo mas é burro. Que mal fiz a Deus para ter um
amigo burro?
Acendeu outro cigarro e tomou rumo contrário ao som da
explosão. Não queria ouvir os estrondos. Foi para longe, para um lugar onde
pudesse apoitar sua canoa, preparar sua isca e esperar que o peixe graúdo
viesse morder o seu anzol.
“É diferente. É muito diferente. Pesca-se o necessário; não
há matança desordenada. Diabo! O fim não justifica o meio.”
Imaginou Raimundo Reis catando as tainhas da superfície. O
samburá do infeliz devia estar entornando peixe, mas não lhe era suficiente, o
pescador sabia que lá no fundo estavam as tainhas gordas, por isso mergulharia
e iria buscá-las.
O sol se escondeu atrás de grossas nuvens, lá onde a
península descamba para o oceano. Nuvens negras, volumosas. O mar do Canal
escureceu e a paisagem mudou. Desenhou-se um quadro de chuva. Teófilo percebeu
que tudo ficou quieto. Julgou que fosse a explosão da bomba a causa de tanto
silêncio. Deve ter assustado as garças e os savacus. Um bando de periquitos e
todo o estardalhaço que fizeram, quando cruzaram o Canal, se ouvia agora longe,
quase como uma ilusão.
Teófilo apurou o ouvido, na tentativa de ouvir a voz de
algum outro pescador. Por aquelas bandas era comum um pedaço de voz vir bater
nos ouvidos. O vento trazia e levava, num bater de asas.
“O tempo virou! Nenhum som. Nada. Ora, o mar está para
peixe.”
Lançou a linha ao mar e esperou.
“Que mais se pode fazer nessa vida?”
***
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